Têm coisas que eu encontro e coisas que encontram a gente. Vini Extravaganza

No início dos processos criativos do Macu, o tema de investigação do semestre se apresenta como um primeiro recorte para as pesquisas das turmas. Sendo que, atualmente, esse tema corresponde ao enunciado: Arte & Vida: O Sistema Stanislávski como Meio para Manter as Relações Vivas.

Para tanto, os coordenadores de cada processo elaboram diferentes modos de colocar as turmas em movimento de criação. Ou seja, formas de despertar a imaginação de alunos e alunas para os estudos práticos. Essas formas são variadas e podem se configurar como idas ao teatro ou até mesmo encontros com certos artistas e pesquisadores.

O primeiro disparador

Nesse sentido, a turma noturna de PA2 e 3 da Unidade Barra Funda coordenada pelo professor André Haidamus começou suas investigações pelo espetáculo Sem Palavras. A peça é a mais recente criação do diretor e dramaturgo Marcio Abreu junto à Companhia Brasileira de Teatro. E foi livremente inspirada no livro Un appartement sur Uranus, do filosofo espanhol transgênero Paul B. Preciado, e nos escritos da autora e ativista brasileira Eliane Brum.

Sem Palavras é literalmente composta por algumas cenas sem palavras, assim como pelo arranjo de corpos e imagens. O espetáculo transita nos universos do teatro, da dança e da performance para expor diferentes modos e ser e estar no mundo. Dessa forma, não só reflexões sobre Arte e Vida são propostas pela peça, como também são problematizadas suas interrelações.

Além de assistir a Sem palavras, a turma de PA2 e 3 estudou o documentário acerca do processo de criação do espetáculo. E tendo sido essa uma experiência impactante e mobilizadora para todas e todos os envolvidos, um encontro com duas atrizes da peça foi organizado pelo professor André Haidamus.

O encontro com as Irmãs Brasil

Assim, Viní Ventanía Xtravaganza e Vitória Jovem Xtravaganza, atrizes de Sem palavras, participaram de um bate-papo no Macu, aberto a quem se interessasse. E, às alunas e aos alunos coordenados por André Haidamus, somaram-se outras turmas do PA2 ao PA5 e estudantes de diferentes horários e unidades.

Viní e Vitória têm uma longa trajetória e formam a dupla conhecida como Irmãs Brasil, “existência de corpas estranhes e artistas travestis”. Por isso, elas não falaram apenas sobre o espetáculo no qual trabalham atualmente. E a conversa passeou pela criação das irmãs no ambiente machista do interior de São Paulo e por suas primeiras referências artísticas: o pai, palhaço de rodeio; a mãe, rainha de bateria.

Desse modo, as irmãs levaram para o debate questões heteronormativas e coloniais correntes do cotidiano brasileiro. Bem como comentaram sobre seus “fantasmas” e arrebatamentos, declarando o esforço para permanecerem vivas em uma sociedade violenta como a nossa, pautada pelo preconceito que se traduz em ódio pelo diferente.

As interrelações entre Arte & Vida

Esses assuntos reverberaram intensamente nos presentes, e muitos convocaram a palavra no momento de diálogo com as irmãs. Todos e todas se colocando com muita tranquilidade e afetividade na relação com as temáticas por elas partilhadas.

Os participantes vibraram, se emocionaram e saíram movidos, querendo “explodir” o mundo fazendo teatro. O que comprova a urgência e a necessidade de encontros como esse para o coletivo de artistas em formação do Macu.

Nesse caso, foram as investigações em torno do enunciado Arte & Vida: O Sistema Stanislávski como Meio para Manter as Relações Vivas que suscitaram esse encontro. Por isso, esse é também um belo exemplo da importância dos temas articulados para as pesquisas das turmas do Macu. Com vistas a um fazer teatral livre e comprometido eticamente, acreditamos ser preciso fortalecer tais trocas de experiências e referências; precisamos sair da nossa zona de conforto e devolver aos corpos “diferentes” de nós o espaço que historicamente lhes foi tomado com violência e desumanidade.

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