Com direção pedagógica de André Haidamus, a criação coletiva Em Obras, baseada no teledrama O Cimento, de Gianfrancesco Guarnieri, se apresentou na ExpoFau 2019, semana de arte da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, realizada em outubro. 

Gianfrancesco Guarnieri, um de nosso maiores dramaturgos, iniciou sua carreira no Teatro Paulista do Estudante e, ainda na década de 1950, passou a integrar o Teatro de Arena de São Paulo, onde despontou com sua peça Eles Não Usam Black-Tie (1958), um marco da moderna dramaturgia brasileira. Em um período de rápidas transformações, a crítica a uma sociedade profundamente desigual dava o tom desta produção, que se politizava em conteúdo e forma. 

A partir de Black-Tie, os operários entravam em cena e tinham suas condições de vida e trabalho representadas em destaque. Este é o caso de O Cimento, peça escrita para ser representada na TV no início da década de 1960, e que expõe os trabalhadores de um prédio em construção, que arriscam suas vidas para erguer uma estrutura que só visa o lucro de alguns. 

Baseando-se nesta situação ficcional, Em Obras acrescenta a ela elementos contemporâneos, como a responsabilização dos empregados pela sustentação de um sistema que é, por si só, insustentável. A frase “Estamos mais um dia sem acidentes”, revela a atualidade da peça e remete às circunstâncias do mundo do trabalho na construção civil, que envolve empreiteiras, arquitetos, engenheiros, pedreiros e demais funcionários numa relação hierárquica que sempre culpabiliza os mais desprotegidos. 

A ExpoFau 

A ideia de uma semana de arte realizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP teve por objetivo reacender e incentivar a produção artística e a reflexão filosófica de seus estudantes, funcionários, pesquisadores e professores. O evento abarcou todas as linguagens artísticas: visuais, textuais, dramáticas,  sonoras, corporais e espaciais. Por meio de exposições, debates, oficinas, instalações, apresentações e celebrações pretendeu-se conceber uma atmosfera de trocas que dessem sentido à experiência dos participantes enquanto sujeitos poéticos. 

As relações entre o teatro e os estudantes de arquitetura remontam também a década de 1960, quando alunos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (hoje Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) e da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo se reuniram para formar o Teatro dos Universitários de São Paulo. Em 1967, o coletivo estreou a emblemática a montagem de Os Fuzis da Senhora Carrar, peça de Bertold Brecht, com direção de Flávio Império. Este trabalho viajou por vários estados brasileiros e participou, em 1969, do Festival de Teatro Universitário de Nancy, na França. Com o agravamento da situação política no país, sobretudo após a decretação do Ato Institucional Número 5, grupos como este acabaram por se desfazer, com raras exceções. Mas, iniciativas como a Expofau e a apresentação de Em Obras neste evento, reavivem uma tradição forçosamente interrompida pela ditadura militar, que buscava unir diferentes instâncias artísticas para refletir sobre a sociedade em que vivemos e pensar em como transformá-la. Pelo que este projeto significa para a nossa história, o Macunaíma valoriza e parabeniza os envolvidos!

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